Viver no campo é poder sair pela
porta da cozinha pela manhã ainda de pijama e cheirar o orvalho de Outono com
os ruídos da calmaria como banda sonora. Há quase sempre cães a ladrar em surdina, vozes de vizinhos que se cruzam ou de gente que faz travessias
condizentes com esta condição de viver calmo, e o chilrear dos pássaros. Agora no Outono menos rolas e outras espécies que desconheço mas que ouço com agrado.
Hoje não foi excepção. A manhã gloriosa de
Outono sacudiu-me o cansaço extremo de uma semana que parecia não ter fim. Desço
as escadas ainda estremunhada. Dormiria mais. E entro na manhã de sol, magnífica, uma verdadeira bênção neste Outono triste de tanta desesperança.
Chamam-me de lá de fora. Já viste a hortelã? Não. Não tinha visto. Adoro
hortelã, talvez por isso morra de amores por um mojito, e quando o jardineiro
me deu literalmente cabo dela fiquei inconsolável. Arranjou-se entretanto substituto.
Embora de aroma e sabor menos intensos, tem crescido a olhos vistos. A enorme surpresa foi, quando alertada, lhe fiz uma visita e vi a minha hortelã
depenada. Depenada a sério. Nem uma folhinha tinha escapado à fome voraz de
algum bicharoco. O manjericão ao lado também levou um desbaste e a salsa ficou
quase careca também. Safou-se o cebolinho. Continua lindo e viçoso. Dos bichos nem rasto. Quase me atreveria a pensar que o Ministro das Finanças e os amigos do governo resolveram passar por aqui tal a dimensão do depenanço.
Hoje deixo-vos uma receita do
tempo em que a minha salsa e hortelã não eram apenas uns ramos desnudados
espetados com ar raquítico e desvalido. Eram frondosos, aromáticos e
proporcionaram-me uns momentos de prazer quando saía de tesoura em punho para
recolher uns ramos e umas folhas. Este
molho argentino delicioso terá de esperar uns tempos para ser repetido.
Chimichurri
Salsa (2 colheres de sopa)
Hortelã (½ colher de sopa)
Orégãos secos (1 colher de sopa)
Malagueta seca (1 colher de chá)
Alho picado (1 colher de sopa)
Azeite (3 colheres de sopa)
Vinagre de vinho tinto (2 colheres
de sopa)
Lavar e picar a salsa e a
hortelã. Usei uma tesoura de ervas aromáticas mas pode ser picado com uma faca.
Juntar o alho e a malagueta. Acrescentar o azeite. Juntar os orégãos e por fim
o vinagre. Mexer tudo muito bem e deixar macerar. Servir com bife de vaca
grelhado na brasa. A quantidade das ervas aromáticas pode e deve variar com o gosto de cada um.
Gosto muito dos contrastes deste molho: a frescura da hortelã com a simplicidade da salsa, o calor da malagueta com o aconchego do azeite, a agressividade do vinagre com a sensatez dos orégãos. Indicado para carnívoros empedernidos é muito bem-vindo por quem, como eu, até quase passa sem carne.
10 comentários:
nunca experimentei este molho mas fiquei com muita vontade.
Beijinhos e bom fim de semana
As minhas manhãs também são assim, saio logo até lá fora, ver o tempo, as cores do dia e sentir os perfumes e calmaria.
E este molho deve ser delicioso e bem aromático, a experimentar :)
Um beijinho.
Nunca experimentei com mais carne nenhuma, Ricardo, mas é capaz de ir bem com outras carnes. A intensidade dos sabores e do próprio molho pode ser mudada nas quantidades :) E de um dia para o outro parece que fica melhor :)
Somos umas sortudas, Ginja, acabei de chegar de comprar batatas e limões quase directamente do produtor :)
Beijinhos
Bom... por aqui nunca bicheza nenhuma se lembrou d eme atacar a hortelã, nem imagino que bichinho a possa desbastar dessa maneira.
Dizem-me que foram lagartas e realmente encontrei umas bem verdes. Lá se foi a 'agricultura' biológica e espetei-lhes com um venenito pelo bucho :)
E não dizias nada às amigas, minha isto, minha aquilo?? Ando tão afastada dos outros blogues que só agora descobri esta delícia... não perdes pela demora, vai já para "blogue da semana" no Delito assim que for a minha vez de escolher!
E vou tirar receitas daqui, olá se vou.
Beijos
Olá Ana,
Pensava que tivesses visto :)
Esta escrita, neste momento, é-me mais gratificante do que qualquer outro. Preciso de coisas para me distrair da realidade.
Beijos
Como eu te compreendo. A cozinha é sempre um refúgio seguro e uma fonte de prazer. :-)
Que saudades... A burrice do ser humano é tanta que teimamos em não ver o bom que temos até o perder...
Adorei este post... acho que por momentos viajei até onde se houvem pássaros e onde o horizonte é povoado de árvores e verde!
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