A Páscoa é ter três ou quatro
anos, um vestido azul-turquesa de fazenda vestido que me picava, era capaz de
jurar que tinha a saia pregueada, e estar às cavalitas de um amigo dos meus pais.
A Páscoa é tremer de medo com a procissão dos farricocos em Braga nesse mesmo
dia do vestido azul-turquesa que me picava mas me aterrorizava menos que
aquelas figuras tétricas sem rosto a fazer barulho cidade fora. A Páscoa era
não haver politicamente correcto e poupar a criança do vestido azul-turquesa de
fazenda àquele susto. A Páscoa é Beira-alta. A Páscoa é Tibaldinho e a festa da
aldeia, o povo engalanado nas suas melhores farpelas. A Páscoa é esperar. A
Páscoa é esperar pacientemente sem meter dedo ou dente perante uma mesa cheia
de doces, bolos, folares pela hora do almoço, controlar o ímpeto de criança,
obedecer aos meus pais e portar-me bem lá nessa casa dos doces, bolos e folares
e dinheiro por baixo de uma laranja na mesa. A Páscoa é esse sacrifício. A
Páscoa é o padre chegar e trazer uma imagem e dar-nos a beijá-la. Diz que era
Cristo menino mas nunca entendi porque se havia de não comer bolos, haver dinheiro
em cima da mesa e beijar uma imagem naquele tempo. A Páscoa é a procissão do
enterro do Senhor pelas ruas de Viseu. A Páscoa é ter muitas dúvidas que dos
mortos nunca ninguém voltou e não me consta que Jesus Cristo apreciasse tanto
fausto, tanta celebração, alguma ostentação. A Páscoa é estar num qualquer
sítio do mundo e pensar Olha, hoje é
Domingo de Páscoa. A Páscoa é a esperança de dias longos, dias novos. A Páscoa é leite-creme queimado com a pá de ferro que
vai passando de geração em geração. A Páscoa é e será sempre pão-de-ló com
queijo da Serra. A Páscoa será sempre o pão-de-ló que fiz, que se fazia para o meu pai. A Páscoa é ele sorrir-me com os olhos amendoados e dizer-me Está uma maravilha, filhota. A Páscoa é
comer o pão-de-ló em sua homenagem. Hoje e sempre.
Ingredientes
250 g de açúcar
125 g de farinha
8 gemas
4 ovos inteiros
Preparação
Forrar uma forma com um buraco no
meio com papel vegetal. Pré-aquecer o forno a 190 º. Bater os ovos com o açúcar até ficar uma mistura fofa e
aveludada cerca de oito minutos. Juntar a farinha e bater mais dois minutos. É muito importante que a massa fiquei bem batida para ficar leve. Deitar com cuidado na forma e levar ao forno com uma folha de papel vegetal por
cima cerca de 45 minutos. O tempo de cozedura vai determinar se o pão-de-ló
fica mais ou menos húmido, é uma questão de gosto. Não fica particularmente
bonito mas é a receita que me foi dada por uma amiga dos meus pais,
curiosamente presente naquele episódio matricial da Páscoa em Braga. Nunca me
falhou até hoje. Ela também não.
17 comentários:
Gostei tanto, Leonor. Tanto, tanto.
Boa Páscoa.
belo exemplo de gastronomia da época
:)
Obrigada, Cristina, muito boa Páscoa também :)
Beijinhos
Mas olha, Mané, é muito comum cá por casa em quase todas as estações. O meu marido pegou-lhe o gosto e adora :)
Que delicia Leonor hummm...
Beijinhos e Feliz Páscoa!!
Boa Páscoa, Mariana :)
Leonor, muito obrigada pelo comentário que me deixou de parabéns, e que bela iguaria aqui nos deixa.
Uma Páscoa feliz e um beijinho
Leonor, gostei mesmo muito! Por aqui também reina o senhor pão-de-ló (um pouco mais escuro que o teu, que está perfeito). também gosto tanto com queijo da serra! essa fatia está um mimo :)
Boa Páscoa! Beijinho.
De nada, Gisela, não sou muito assídua nos blogues mas gosto de deixar umas palavrinhas e um aniversário é sempre uma ocasião especial.
Beijinhos
Este até ficou mais claro do que o costume porque gosto dele ainda húmido, Ginja. Nem sempre consigo, às vezes deixo-o tempo de mais no forno :)
Beijinhos e um resto de bom Domingo de Páscoa.
Leonor,os textos dos teus postes são soberbos. Porém, neste excedeste-te.
Gostei muito, muito e muito.
O Pão de Ló está fantástico.
Nunca me arrependo de vir visitar-te.
Beijinhos,
Maria
Tanto mimo que me dás, Maria :) Muito muito obrigada!
Beijinhos grandes
Que aspeto, que belo...que tentador, é um prazer conhecer o blogue...bjs
Olá Belinha, bem-vinda :)
Beijinhos
a combinação ideal, pão-de-lé e queijo da serra:D
Gosto muito também, Vanessa :D
Tenho poucas memórias da Páscoa, a minha família é muito pouco católica de todos os lados que se possa imaginar e a nossa festa de família é mesmo o Natal. Mas adorei estas memórias. Sobretudo, a dos olhos amendoados do teu pai. O pão-de-ló ficou lindo e diz-me, será aquilo um belo queijinho da serra? Beijos, estou a adorar este périplo...
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