domingo, 24 de fevereiro de 2013

Momento Masterchef numa torta de chocolate


A proliferação de programas e canais de culinária foi das piores e das melhores coisas que me podiam ter acontecido. Melhor porque enriqueceu substancialmente este meu gosto de misturar sabores, mostrou-me uma panóplia de chefs que desconhecia, contribuiu para corroborar algumas certezas sobre a cozinha e estimulou a variedade cá por casa. Não me tenho dado mal. Só vantagens. A parte menos boa é que as  experiências culinárias passaram a ser sujeitas a um veredicto certeiro depois da incursão em palatos alheios. Desconfio que o apuramento de olfacto e paladar que tanto me caracterizam terá passado por osmose para o meu consorte. Adquiriu os tiques todos, a linguagem adaptou-se ferozmente e ‘flavour’ passou a ser a palavra eleita. O momento Masterchef do dia é seguido de grande risada mas de vez em quando sou avisada de que teria sido ‘chopped’ ao que respondo que aqui a minha modesta cozinha não está a concorrer para nenhuma estrela Michelin e que Michelin cá em casa só mesmo uma protuberância que me envolve a cintura. A minha grande e enorme sorte é que, por via da minha profissão, estou habituada ao escrutínio implacável de trinta almas que mudam a cada noventa minutos. Se fosse rapariga fraca de nervos e comichosa nas opiniões alheias ter-me-ia já debulhado em amuos mas se fosse rapariga pródiga em amuos jamais este post veria a luz do dia. Esta receita que hoje publico passou coxa no crivo selectivo. A ganache. Dizem-me que ficaria melhor sem ela. Teimei. Não pode. Sem ganache fica sensaborão. Mas quem sabe se a tivesse substituído por doce de frutos vermelhos não ficasse pior. Há que ouvir a crítica. E seguir a intuição. Doce de frutos vermelhos na próxima. Serei ‘chopped’?

Torta de chocolate

Ingredientes
Para a torta:
250 g de farinha com fermento
2 ovos
2 dl de leite
6 colheres de sopa de açúcar
6 colheres de sopa de chocolate em pó
50 g de manteiga.

Para a ganache:
Meia tablete de chocolate culinário
2 colheres de sopa de açúcar
1 colher de sopa de manteiga
150 ml de natas

Confecção
Pré-aquecer o forno a 200º. Forrar um tabuleiro com papel vegetal anti-aderente.
Numa tigela misturar os ingredientes secos. Fazer uma cova no meio e deitar os líquidos. Com a batedeira em velocidade baixa, misturar todos os ingredientes até ficar uma massa homogénea. Não bater demasiado. Deitar no tabuleiro e levar ao forno cerca de doze minutos.
Enquanto a massa coze, partir o chocolate em pedaços pequenos e derreter com a manteiga e o açúcar. Juntar as natas e mexer até ficar um creme liso e brilhante.
Desenformar a torta sobre um pano ou rectângulo de papel vegetal polvilhado com açúcar. Barrar com uma parte da ganache e enrolar. Colocar na tarteira e regar com a restante ganache. Deixar arrefecer e nham nham.

Receita tirada de uma "Saberes e Sabores" do tempo em que eu ainda comprava revistas de culinária. Gosto muito desta torta. É pouco doce, meio húmida, fica ainda melhor no dia seguinte e é muito fácil de fazer. 

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Pilaf de frango com açafrão


Um manto cinzento e denso, sem réstia de sol e as letras que tantas vezes vira na época da Guerra Fria, ainda na televisão a preto e branco a quem o sr. Machado mudava as válvulas de vez em quando, não me deixavam dúvidas: Moscovo.  Na televisão a preto e branco, Moscovo era sempre o lugar inatingível lá num mundo distante que divida o presente entre a terra prometida onde todos os homens tinham as mesmas oportunidades, protegidos por um estado social forte empenhado em munir os seus cidadãos com uma educação exigente e os que ruborizavam só de ouvir a palavra ‘comunismo’ soar e eclodiam em iras primárias contra o estado providência. Conheci ambas as espécies. Em casa dos meus pais sempre se foi de várias cores. Ali estava agora, na cidade outrora proibida de um país de onde vinham testemunhos que nunca coincidiam.
À chegada esperava-nos um serviço de táxi representado por uma muralha de frio: algures nos seus quarenta anos de olhos transparentes, não articulou palavra sem que lhe tivesse dirigida antes e respondeu sempre de forma lacónica. Incapaz de ceder passagem a alguém que poderia ser sua mãe e indiferente a malas e a quem as carregava, este ser gélido poderia ter funcionado como uma antecipação dos dias que se seguiram. Esta experiência foi exponenciada por um outro factor: os russos além de não rirem nem sorrirem, não falam línguas estrangeiras e quem se quiser aventurar por aquelas terras terá também de lidar com o insondável alfabeto cirílico. Muitas aventuras numa viagem só. O alfabeto cirícilo era útil para muitas coisas preciosas à sobrevivência em terras de czares e sovietes entre as quais comer. Perto do hotel havia dois restaurantes que haviam de fazer parte da nossa rotina. Incapazes de decifrar grandes tratados em cirílico, restou-nos confiar nos parcos conhecimentos de inglês das empregadas no restaurante uzbeque. Ao contrário dos outros russos – seriam uzbeques?- eram simpáticas e esforçavam-se para que nos entendêssemos. A morena ainda arranhava um inglês exíguo, a loura nem exíguo nem coisa nenhuma e foi pela mão dela que comemos uma das refeições mais reconfortantes lá no alto do mundo: pilaf.  

Pilaf de frango com açafrão

Ingredientes
Peito de frango (cerca de 500g)
1 iogurte grego (125g)
Sumo de 1 limão
1 colher de café mal cheia de canela moída
1 colher de chá de açafrão
Pimenta preta
Sal
Pimenta Cayenne
Bacon cortado em bocados pequenos
Arroz basmati
Caldo de carne
Cardamomo (3 sementes)
2 colheres de sopa de cajus (usei uma mistura de cajus e amendoins picantes)
2 colheres de sopa de pistáchios
Salsa picada
Azeite


Preparação
Cortar o frango em pedaços pequenos. Temperar com um pouco de sal e pimenta preta acabada de moer. Juntar a canela, o açafrão ( ½ colher de chá) e a pimenta Cayenne. Adicionar o sumo de limão e o iogurte grego. Marinar uma hora no frigorífico.
Aquecer uma noz pequena de margarina com um fio de azeite e fritar o arroz até ficar translúcido. Juntar o dobro da medida do arroz em caldo de carne. Adicionar as sementes de cardamomo esmagadas, sumo de meio limão e o açafrão (1/2  colher de chá). Escorrer o frango num passador para retirar o excesso do iogurte.
Aquecer uma frigideira antiaderente e fritar o bacon até ficar dourado e crocante. Se for necessário, acrescentar um fio de azeite. Retirar da frigideira e reservar.
Na mesma frigideira fritar o frango em pequenas porções para que ganhe cor. Aquecer uma frigideira e sem qualquer gordura torrar os cajus.
Mexer o arroz com um garfo e envolver o frango, o bacon, a salsa e, por fim, os cajus. Salpicar com os pistáchios e servir. 


Fiquei fã. Gostei da complementaridade de sabores e texturas: o calor da canela, a frescura do limão, o travo cítrico do cardamomo, a textura muito tenra do frango, o crocante dos pistáchios e cajus.


Inspirado nesta receita da Nigella.