Zwetschgen. Ainda sou do tempo em
que não havia grandes superfícies, centros comerciais e se vivia ao ritmo das
estações, bem marcadas então. Comia-se também o que a terra e o tempo dava, a
fruta da época era ainda um conceito e não havia uvas fora do seu tempo ou
fruta grande e lustrosa mas sem sabor. Nesse mesmo tempo, vivia-se também na
ignorância de muito do que a globalização veio trazer depois, a profusão de diferentes
frutos e legumes, exóticos ou apenas desconhecidos. Quem me ouvir falar pode
julgar que vivia deslocada algures num lugar ermo e sem acesso ao mundo dito
civilizado, mas não. Vivia onde sempre vivi: uns meros 30 quilómetros a
noroeste de Lisboa. A vida era tão diferente que muitas vezes me pergunto como
eu e tantos como eu sobreviveram à pasmaceira que era ser, por exemplo, adolescente
nesse tempo. Havia pouco que fazer e pouco que fosse tão estimulante como
alguns dos desafios actuais. Bem, mas ao que venho prende-se com a primeira
palavra deste post: Zwetschgen. Quando vejo os frutos é a primeira palavra que
me vem à cabeça. Essa mesma. Em alemão. E isto porque a primeira vez que me cruzei com um
fruto daqueles, afinal tão comum, foi a primeira vez que pus pé fora deste país
a sério e digo a sério porque Espanha já aqui ao lado não conta, faz parte da
minha matriz, faz parte da nossa, a proverbial viagem a Espanha para comprar
caramelos que na verdade servia para muito mais do que isso. Foi também nessa
viagem à Alemanha bem no início dos anos oitenta que terei provado pela
primeira vez mirtilos, cresciam desalmados no jardim da casa onde passei duas
semanas, e eram preferencialmente comidos em panquecas. Zwetschgen são afinal
abrunhos verdes. Maravilharam-me naquele tempo em pequenas fatias rectangulares vendidos nas padarias e pastelarias, com Streusel, também não sei traduzir, e eram a prova de um outro mundo que fui descobrindo lentamente ao longo da vida. Foi nos abrunhos que recaiu a minha escolha para uma deliciosa
galette e só não lhe chamo galette de Zwetschgen porque há limites para o
desvario das palavras. Vejam se gostam.
Galette de abrunhos verdes
Massa:
300 g de farinha de trigo
200 g de manteiga gelada
3 colheres de sopa de açúcar
1 colher de chá de sal
1/2 chávena de água bem fria
Recheio:
Abrunhos verdes
Framboesas
Açúcar amarelo
Raspa de lima
Pimenta da Jamaica acabada de moer
1 colher de chá de amido de milho
Preparação
Numa tigela larga, juntar a
farinha, o açúcar e o sal. Cortar a manteiga bem fria em pedaços pequenos,
juntar à farinha e com um
amassador manual ir conjugando todos os ingredientes até se
assemelhar a uma areia irregular com pedaços de tamanhos diferentes. Juntar a
água em pequenas porções e amassar apenas o suficiente para ficar mais regular. Pode usar-se uma espátula mas não as mãos. Transferir para uma superfície enfarinhada, amassar levemente
com as mãos e formar um disco. Levar ao frigorífico uma hora para
descansar.
Entretanto, preparar a fruta. Lavar e
cortar os abrunhos em oitavos. Misturar o açúcar e a raspa de lima para
libertar o aroma e adicionar a pimenta da Jamaica. Adicionar por fim o amido de milho. Juntar os abrunhos e as
framboesas, envolver, e reservar.
Passado o tempo de descanso, pré-aquecer
o forno a 180º. Retirar a massa do frigorífico e, em papel vegetal
anti-aderente, tender uma circunferência grande. Pegar no papel vegetal com a
massa e pousar sobre uma forma de tarte. Dispor os abrunhos e as framboesas.
Dobrar a parte excedentária da massa sobre a fruta e transferir a galette com
o papel vegetal para um tabuleiro de forno. Pincelar com água, polvilhar com
açúcar mascavado e levar ao forno cerca de 30 minutos.
Notas:
- A massa deve ser pouco manuseada,
já que o manuseamento excessivo irá comprometer a textura e consistência.
- Os procedimentos finais devem ser
firmes e rápidos, sem grandes hesitações, o calor ambiente irá provocar amolecimento da massa e tornar
impossível o manuseamento.
- Optei por esta técnica de usar
uma forma de tarte para moldar para ficar mais uniforme, mas pode ser feito
marcando uma circunferência na massa onde se deve deitar a fruta e dobrar a
massa sobejante para dentro.
Com esta galette inicio a minha participação no grupo
Dia Um... na Cozinha! O desafio deste mês de Setembro era fazer uma galette de fruta.